Lua em mim

Guardo no peito uma lua
roubada de cada céu
marcado por teus olhos
sendo assim, toda vez
que suspirar uma lembrança
há de se encontrar em mim.

Ana Paula Coelho

Teu sobrenome

Tem um sorriso de canto de boca
que nunca caminha sozinho
vem sempre acompanhado de um suspiro
meio adolescente, meio doce
que perfuma o quarto inteiro de memórias...

Dei teu sobrenome a esse sorriso.

Ana Paula Coelho

Infinito de reflexos

Das coisas que eu nunca quis
só pra mim
quase em segredo
está teus verbetes
teu vocabulário
a me acorrentar...

Mantida num limbo
que não sei bem onde vai dar
permaneço suspensa
acima de toda crítica e moral
acima das leis inventadas
do bem e do mal

Sinto nas tuas palavras
as minhas
como se fossem espelhos
frente a frente
e o caminho infinito de reflexos
marca apenas um começo.

Ana Paula Coelho

Palavras suspensas

Se rolam as ondas
por sobre todas as conchas e pedras 
na areia
por que achas que seria possível
cessar o que me transborda?

O que me atrai para o teu centro
transmutando em poesia e vida
toda aquela instabilidade
que eu tanto conhecia e queria me livrar...

Colheu-me!
Como se eu fosse uma rosa sem dono.
E agora?!

Falou-se tanto em ser cretina
e ser covarde e o que você está fazendo?
Veja, isso não me dói
sou filha das palavras suspensas no espaço
não sei perder - nunca soube
o que de fato me inspira.

Ana Paula Coelho

Sem frequência

Impossível pausar as ondas do mar!
O mesmo se dá
com o que me transborda através de ti.
Cancelou nossa conexão
meu estímulo pra te exibir
o que tenho de mais caro
meus tesouros
que há muito guardo pra encantar.
Ficamos no mesmo agora
sem sinais, sem frequência
sem aquela ciência chamada interligar.

Ana Paula Coelho

Carolina

Para a jovem e talentosa amiga poeta Vitoria Milliole...


O que faltar em palavra
que te sobre em sorrisos
olhares, sentidos, símbolos
no tanto de todo que enxergo
nesse teu multiverso de menina

E de tudo que passeia por tua rima
teu plano cenário em verbo-estético
te escolho e te conservo em Carolina.

Ana Paula Coelho

Brumas

Suspenso o jogo das vozes
fico com o silêncio
que fez de mim o que não sou:
esse coração cheio de saudade
de vulnerabilidade
mulher enfim
e por ser assim
trago flores, asas
brumas
que esboçam ecos ainda não deletados.

Ana Paula Coelho

Voo das sementes

Encontre seu amor imperfeito
e vá ser feliz com ele!

Não importa que dancem lentamente
enquanto a música do mundo cifra acelerada.

Ninguém é obrigado a ter o mesmo ritmo!

Mais vale andar só de mãos dadas
azulando pegadas na lua
a levar uma vida programada...

Sem recaídas de filme noir
sem sentimentos lardeados
sem um coração bordado de pássaros
transportando sementes ao voar.

Ana Paula Coelho


Obs: Até hoje os especialistas não chegaram a um consenso se o noir é um gênero (como drama, comédia, suspense) ou um estilo de filmagem. A classificação foi cunhada em 1946 pelo crítico francês Nino Frank para se referir a um tipo de longa-metragem de suspense que estava em voga nos anos 1940 com ambientação urbana, temática criminal e anti-heróis. O visual costumava ter fortes influências da corrente cinematográfica conhecida como expressionismo alemão e da técnica de claro/escuro do pintor barroco Caravaggio (daí a escolha do termo "noir" que significa "preto" em francês). Porém, esse termo e o prestígio dos filmes noir, só se consolidou na década de 70. Especialistas classificam como noir mais de 300 títulos produzidos entre 1940 e 1958.

Frágeis

Hoje me olhou
como se em meus olhos
existisse um abismo
um buraco negro
de onde
caso ele se arriscasse
nunca mais conseguiria voltar

passou a estranhar meus olhos
esquecendo que antes tinha a mania
de os querer engaiolar
como se fossem pássaros novos
frágeis, fáceis de capturar
pela ansiedade de ser livre
pelo próprio despreparo de voar.

Ana Paula Coelho

Tecla SAP - 4

Fale coisas mundanas
deixa eu ser seu escravo
penso em você aqui na cama
gosto de ser só seu a noite toda
eu busco seu sorriso na parede
vejo fotos no espelho
trago você no pensamento
figura de mulher sem voz...

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Morro de rir longe de você
morro de rir do seu lado
morro de rir com as paredes
morro de rir como tarado
morro de rir às vezes sozinho 
lembrando dos seus pensamentos
morro de rir com seu verbo
morro de rir com seu jeito
morro de rir com verbetes
morro de rir das suas conjecturas
e adoro ouvir suas mentiras.

Marcio Bana

Tecla SAP - 3

De poeta e louco, todo mundo tem um pouco. 
Basta usar a tecla SAP e descobrir nas entrelinhas...


É difícil fazer poesias
falar versos pra mim 
é fácil dizer que me ama
sem mesmo me conhecer
me deitar no teu jardim
isso é fácil de fazer

é fácil fazer poesia
dizer que me ama
de noite e de dia
só não é fácil aguentar

me ajudar
me deixar chegar mais perto
isso é difícil
é concreto
e na vida tudo passa
tudo
tudo passa.

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Sinto saudade 
da mulher que eu não conheço
que só leio as palavras
que vejo um começo
e começo a pensar
e sinto... (meu Deus que louco)
na cama pensando nela
de noite, de dia, deitado
olhando para sua poesia
me ofereço
noite e dia pensando
e você dizendo que faço drama
e eu me deleito desse desprazer
mas não tenho você
coisa louca
esse sonho de todo dia.

------------

Dizer que me ama é muito fácil
você não sabe o que está perdendo
nenhum momento eu penso em ser leviano
apenas deitar na cama do seu lado
ser seu amigo, companheiro
quem sabe um dia ser seu escravo
eu respondo aos seus pensamentos
e crio um estereótipo na sua cabeça
louca, louca, louca de paixão
porque essa voz me deprime
comprime tanto no meu sexo
como no meu gozo
a mulher louca de desejo
eu te desejo loucamente
por gostar da sua voz madura
insensata e sem jeito
eu gozo, eu gozo... eu gosto.

Marcio Bana

Tecla SAP - 2

De poeta e louco, todo mundo tem um pouco. 
Basta usar a tecla SAP e descobrir nas entrelinhas...


Agora estou sozinho
fala comigo, fala comigo
conta pra mim as tuas mentiras
me dá conversa, um verso bonito 
para escrever contigo
na romaria da TV
na romaria dos aflitos
na romaria das mulheres
na romaria de todo dia acordar
tomar banho, trabalhar, voltar
acordar, dormir, tomar banho
lembrar de você quando dorme
quando acorda e quando
também toma banho...

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Palavras, palavras, palavras
que você não sabe dizer
o que tá escrito, palavras
são só palavras e você não entende
o que eu escrevi, apenas palavras
são gestos de carinho, de amor
e de incompreensão.
Compreenda as palavras, são tantas!
que eu não sei nem te dizer
estou escondido atrás da porta
sem poder bater
não sei seu endereço
não sei como eu começo
não sei, não sei o que dizer
só sei que no fundo eu sinto
lá no fundo
uma grande vontade de te ver
que calor, que ousadia
você não podia se rescrever
se reinventar, sair, fugir, precipitar
o que você não plantou
não dá pra começar a querer uma pessoa
só porque ela é doce no seu conjecturar...

Marcio Bana

Fala comigo

Me fala do teu delírio
que classifico como drama
mas no fundo sei que tá aflito
talvez com minha inconstância

ou com alguma frase
que só de sacanagem
eu ainda não tenha dito

"fala comigo, fala comigo, fala comigo"

e tudo fica extraordinariamente mais bonito...
mais quente, mais úmido
mais tinto.

Ana Paula Coelho

Eita

Você sente uma energia
não sabe que vem de uma pessoa próxima
nem sabe o que ela tem no coração
se o bem ou o mal
mas você sente uma atração
um enigma
que na verdade é projeção
mas só depois de muita decepção
você finalmente entende

E o saldo é poético
é patético
quando você percebe que passou 
e ainda pode passar
vários anos
fazendo papel de idiota
sem saber que cada entrega tua
é uma peça
um riso alheio
é tudo que você mais tem feito
- Sonhar até agora
e esperar o impossível dia
em que ele então diria: Eita.

Ana Paula Coelho

Trilha do segredo

É de pele 
de química
não se explica num toque
num beijo

Só se satisfaz
na frente do espelho
rindo sozinha pra si mesma
lembrando a trilha do segredo

Que os dedos
de forma tão experiente e eficaz
percorreram
seguindo o mapa dos desejos.

Ana Paula Coelho

Sussurro do tempo

Alguns amores são ventos
que te sopram suaves no rosto
feito um sussurro do tempo.
Outros te nublam os dias
com caos e arrependimento.

Ana Paula Coelho

Rosa azul

Dedico uma rosa azul a todos os primeiros amores que um dia na Terra o cupido destinou... Àqueles que desconhecem as dores que só a experiência vai depositando em nossos corações... E que tanto pesa...
Pesa passar despercebido o beijo de boa noite e o abrir a porta do carro quando entramos ou saímos. Pesa o esquecimento do presente de cada um dos anos de aniversário e o sentados juntos no sofá comendo pipoca e assistindo seriado...

Pesa a redução das ligações diárias enquanto estamos no trabalho...

Pesa o indiscreto olhar em outra direção, ainda que sentado ao nosso lado. Pesa a rispidez de um mesmo vocabulário que agora abandonou, talvez na gaveta do armário, palavras tão simples, mas cheias de significado, como: "eu te amo" e "hoje te espero acordado".

Ana Paula Coelho

Céu e solidão

Entediado de céu e solidão
um anjo fez chover na noite
dos poetas e dos amantes.

Ana Paula Coelho

Jeito de ilha (segunda versão)

Me conta piadas novas
dá teu jeito de alegrar meu dia
rimas doidas num bloco de notas 
poema das horas sem tua despedida

e como numa prosa gozada de Miró:
"vem alcançar meu sonho por inteiro"
faz bolo, café - essas coisas de zelo
e me diz que tua Lista é apenas 
de supermercado...

que os teus beijos são raros
e teus discos de Fátima Guedes
não cantam de fato tua dor
são só letras pra ouvir
teu jeito de ilha
armadilhas 
pra me seduzir.

Ana Paula Coelho

Vão da noite

Não, hoje eu não quero conversar
só quero ficar dentro do vão da noite
insone com o meu tédio e um filme cult.

Ana Paula Coelho

De cara

E se eu saísse de casa 
fazendo uma oração
a Virgem das Graças:

"que teu sorriso me reconheça 
logo de cara
nas primeiras piadas
mas se teu coração entardecer
não esquenta
te pago o Chopp da primeira rodada"

eu teria sorte?

Ana Paula Coelho

Constantes verdades

Diante do espelho das vaidades
me abraço de constantes verdades
para que jamais seja criado um reflexo
daquilo que só se propaga para confundir.

Ana Paula Coelho

Cruz celta

vem mais pra perto

tire agora desse concreto
tuas opiniões reviradas
endurecidas, mortas

quebra e joga fora

sai da tua zona de conforto
planta asas entre os pés
que sementes voam

experimenta o olhar

olhos nos olhos são faróis
legenda de filme francês
- tua cruz celta na pele

aceita os acasos

vai que são elementos raros
páginas de um livro antigo
consumido ao contrário.

Ana Paula Coelho

Jeito de ilha

Me conta piadas novas
dá teu jeito de alegrar meu dia
rimas doidas num bloco de notas 
poema das horas sem tua despedida

e como num gozo prosado de Miró:
"vem alcançar meu sonho por inteiro"
faz bolo, café - essas coisas de zelo
e me diz que tua Lista é apenas 
de supermercado...

que teus beijos são raros
e teus discos de Fátima Guedes
não cantam de fato tua dor
são só letras pra ouvir
teu jeito de ilha
armadilhas 
pra me seduzir.

Ana Paula Coelho

Jogo da rotina

Embora vítima do tempo
desfolha-se o entardecer de versos
como antes pretendia

dourando-me as retinas
uma ciranda arrastada de desejos
dança ao refrão dos dias...

embaralho o Jogo da Rotina
para que cada pires, cada xícara
jamais retorne ao seu lugar.

Ana Paula Coelho

Ansiedade de cursor

Sob muitas influências
e agora sem o estopim habitual
ela estagnou na dimensão dos nadas

perdeu o olfato para as rimas
o paladar para as palavras
tudo parecia realidade

e de realidade a poesia não vingava.

Angustiada ela sofria
uma ansiedade de cursor |
piscando expectativas...

sem sair do lugar
sem ter o que dizer
sem ter o que salvar.

Ana Paula Coelho

Febre de subjetividade

Não dá pra escrever poemas 
sem que se tenha um toque de blues no coração. 
Um tanto de saudade, uma dose de ilusão 
que um dia se desfez no vento feito nuvem, 
mas que até hoje se deixa dedilhar numa canção...

Não dá pra escrever um poema 
sem que se tenha perdido algo de concreto na vida. 
Um ente querido, uma amizade antiga, 
um grande amor com o qual se teria construído uma família 
ou editado um livro...

Não dá pra escrever um poema 
sem febre de subjetividade até os ossos. 
Asas nos pés, estrelas nos olhos, 
uma lua refletida no espelho do mar 
cintilando conchas na areia, 
inspirando um cântico hipnótico de sereia...

Não dá pra escrever poemas 
sem aquela velha voz interior sempre lembrando 
que é possível ir além, sem medo de errar 
e com sensibilidade suficiente pra entender 
que o poeta não domina um poema, 
o poema é que o detém.

Ana Paula Coelho

Eixo

Apenas um pouco de paz
Disse largando o vinho sobre a mesa 
Cruzou os braços e esticou as pernas
Queria relaxar as ideias
Adormecer as sentenças
Pra que seu eixo se estabilizasse
Só assim voltaria a sentir
Não só o frescor, mas a presença 
Da rosa branca que trazia no peito
Com todas as respostas em segredo.

Ana Paula Coelho

A maior de todas

A maior beleza de todas, ainda reside no coração mais puro, 
na gentileza gratuita, na caridade discreta, 
na capacidade de filtrar palavras que possam ferir por ironia.
A maior de todas as belezas, nunca esteve por fora, 
sempre esteve por dentro. Dentro de tudo que é sincero, 
que é troca sem segundas intenções, dentro do perdão 
que não se preocupa se é Deus ou uma pedra quem está observando, 
pois se comporta do mesmo jeito com ou sem testemunhas. 
A maior beleza de todas está na vontade de compartilhar sem competir. 
Na habilidade de expor tudo que há de profundo e eterno 
no espaço de tempo que tanto ensina, mas que pouco se aprende, 
ainda que seja em forma de prosa ou de poesia.

Ana Paula Coelho

Capricórnio com ascendente em peixes

Ela é de Capricórnio
Com ascendente em Peixes
Adora rosa branca 
Flor de cerejeira
Borboletas e luas
Corações e estrelas
Bebe muito café
Parou de fumar recentemente
Sua cor preferida é azul
Mas veste o preto irreverente
Gosta de cabelos curtos
Brincos de argola
Sapatos confortáveis
E só usa bijuterias de aço ou de prata
Não consegue fazer uma conta de cabeça
Decorou uma lista com mais de mil filmes 
Escreveu um poema para Louis Garrel
Seu poeta preferido é Leminski
Ainda guarda livros da adolescência
Ama Bon Jovi e The Beatles
E prefere escrever de madrugada.

Ana Paula Coelho

Muito mais

Dizem tantas coisas dos poetas...

Que são tristes
Solitários
Melancólicos
Otários
Depressivos
Suicidas 
Mentirosos
Dramáticos
Egocêntricos
Sem noção
Tímidos
Sedutores
Românticos
Sexuais
Psicopatas
Idiotas
Letárgicos
Letais 
e muito mais...

Digo que os poetas são, apenas.
Eles apenas são. 

Ana Paula Coelho


Tecla SAP

De poeta e louco, todo mundo tem um pouco. 
Basta usar a tecla SAP e descobrir nas entrelinhas...


Ao invés de tirar pra dançar 
Te levo mundo a fora 
Passear em pensamentos 
Ouvindo histórias
Puxando um pouco de atenção
Através de verbetes e palavras
Aglomerados da cabeça para o lápis 
A amizade de seduzir teu coração 
Buscar compreender tua alma ferida
Também trago no peito minhas marcas
De arranhões que eu mesmo escolhi 
Para serem pequenas tatuagens no meu espírito.

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Com meus poemas busco
Entender essa loucura de ser humano
De ter amigos e amores
E nessa outra parte, talvez 
Eu possa ser um pouco desorientado do amor
Mas, orientado do coração, da boa conduta
Do correto e do que há de mais belo
Buscando entre o desalinho da civilização na cidade 
Manter-me sóbrio sem bebidas ou drogas
Apenas buscando um enriquecimento maior
Desse meu amor pela desgastada solidão.

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Ah mulher sutil de muitos encantos!
Na lareira esquentando o corpo sozinho
Busco me converter a mim mesmo
E entender meus fantasmas 
De um passado sombrio
Tomando coragem pra mudar de novo
Essa vida de acomodações e loucuras
Sem mais estar nessa caverna
Partir para um outro mundo
Sem ter pressa de ficar acorrentado.

Marcio Bana

Teus áudios

lendo tuas linhas
me conta cada palavra enigma
um pouco do que tu carregas no peito
afoito peito pássaro
de passados e futuros instantes
em teus méritos
no que também tentas conter

ouvindo teus áudios 
tradução necessária e urgente
de tudo que perdi por não entender
trouxe novidades e sentidos
vestiu de paciência as horas
de pensamento querendo virar fumaça
foi o grave da tua voz
que hermeticamente me destituiu

Ana Paula Coelho

Labirinto infinito

Se fosse perfeito
ainda estaria guardado no peito
e não numa esquina que se cruza correndo
sob ameaça de chuva quando muda o tempo

Se fosse pra ser
não teria apenas conversa arquivada
com tantos achismos, tantas ciladas
nem pausas de raiva e arrependimento

Se fosse destino
o beijo traria um labirinto infinito
milhões de poemas seriam escritos
e a intenção viveria em lua de mel.

Ana Paula Coelho

Resposta a Oração de Vitoria Carolina

Acredito que estamos aqui na Terra para aprender e evoluir. 
Acredito que o maior aprendizado de todos 
é justamente o que a maioria hoje em dia ignora: o amor ao próximo. 
Sei que um dia, todos no planeta terão a percepção 
de que somos muitos e, somos um só, ao mesmo tempo. 
E Deus não mais precisará dispor de todas as respostas, 
porque não mais lhe serão feitas todas as perguntas. 
Sei que nesse dia, o universo aumentará o seu processo de expansão, 
e a condição humana será de apenas renascer pra construir 
ao invés de só morrer por destruir.

Ana Paula Coelho

Rimas tangíveis

Gosto da noite que me devora 
até o último fôlego,
da inspiração que me consome
até o mais nítido verso
e do resultado, ainda que incerto
de todas as rimas tangíveis.

Ana Paula Coelho

Asas da leveza

No âmbar de uma noite meio tímida
pela luminosidade nas folhas
um poema se escrevia

Solto, nas asas da leveza que o atraía
um coração outrora tão descrente
de versos e rimas se expandia.

Ana Paula Coelho

Zizo e Eneida

Desse filme que tanto me marcou por sua densidade, deixo o registro cronológico dos três poemas que Zizo (Irandhir Santos) escreveu para sua musa Eneida (Nanda Costa) em Febre do Rato...


Observo a coisa que se aproxima
Com a arma em punho
E na outra, bastante trêmula
O desprezo de suas investidas
Desnudas à porta dos dias
Semimorta no centro do mundo
Agressiva nas coisas miúdas
E abstrata, nos problemas dos dias.

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Fodendo calada na noite
Furacão distante e lindo
Sua prosa leve e solta
Maligna em sua atitude
Fria em sua dureza
Recebo no rosto o seu mijo... mirrado pelo espelho
Que nem tempo dá para reparar no reflexo
No cabelo complexo da boceta da menina
E na mão antiga, amiga enfadonha
Precipita sobre o corpo vadio
A baba do quiabo tocado pela imaginação.

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Escrevi meu nome em um sacrário
Que se encontra ao lado da geladeira
E próximo aos pequenos frascos de remédio
E junto a isso tem uma estante
E sobre essa estrutura um espelho
Que reflete o rosto do homem
Com quem cotidianamente tu compartilhas o dia
E faz coisas diferentes
Como declamar o abecedário de traz pra frente
E eleger certas cores raras, como suas preferidas.
O homem comum, o mesmo do espelho
Não acreditava muito nos pensamentos, e começou a listar:
Passei o dia cortando passos, arrumando coisas
Desfazendo nós, roendo as unhas
Falando só, assistindo TV
Descobrindo ruas, circulando mapas
Fumando cigarros, trapaceando bandidos
Viciando o organismo, analisando o sangue
Regendo conflitos, adulando desejos
Reinventando sonhos, evitando pânicos...
Destratou seus sentimentos como que pedindo benção a Deus
E ao Diabo pra o livrar das contas, e entrou em casa.
Deixou a arrogância lá fora descansando
Pra beijar a juventude que dormia no sofá.
Beijou, e sua mão entrou tanto, tanto, tão longe
Que alcançou o coração do sonho
E ali teve a certeza de que queria entrar
No sonho por inteiro.



Poesia prescrita

Aqui, ainda que breve 
entre os neurônios abstinentes
a poesia, não pense
que deixou de existir.

Dormiu versando sonhos
rimando verbos e mistérios 
que fazem do poema o que ele é:
um universo na hora em que termina...

Aqui do fundo mais fundo
no escuro mais pleno, só e absoluto
a poesia prescreveu
se convertendo em outro assunto.

Ana Paula Coelho

Adormeço

Os dias passam lentos
noturnos
e a cada hora me cai uma lua
uma estrela nos olhos
Adormeço 
nesses dias sem dias
sem sóis
sem sonhos
sem nós.

Ana Paula Coelho

Soneto do Desencontro

Soneto inspirado no filme: Os Agentes do Destino com Matt Damon e Emily Blunt.


 Dedico um soneto ao desencontro 
Que num sopro apagou a linha reta
Que um anjo de Deus riscou na areia
Nublando, assim, a trilha dos amantes

Os condenando a seguir pela vida, errantes 
O fez sem dó, só para vê-los mais distantes
O desencontro desconhece o que é dilema
Não sabe do caos e suas consequências

Não sabe o que é sentir a todo instante
O coração pesar vazio, triste, delirante
Sem sequer achar quem o compreenda

O desencontro é feito emenda
Se muda a rima de um soneto
É pra estragar todo o poema.

Ana Paula Coelho

Os olhos de Kiki

Nos olhos de Kiki
Vejo origami infinito
De pássaros coloridos
Com pupilas radiantes
Que fotografam o mundo!

Mas não é só de belezas
Que vive o Verde desses olhos.

Se escurece de tristeza
Reacende brilhante na alegria
Se chora lágrimas de decepção
Dá mil vezes a volta por cima 
Rodando nas asas da retina 
Feito um furacão...

Os olhos de Kiki não são fracos não!

É uma tela em branco a se pintar
Com enlevos de pluralidade
De fé, amor ao próximo
E simplicidade.

Ana Paula Coelho

Recompensa

Das coisas raras 
que voam de nossas mãos
por serem coisas soltas
digo de forma serena
que o tempo é recompensa
ainda que tentem nos tirar a graça
de quem sempre sonha acordado
com estrelas nos olhos e asas 
no lugar dos sapatos.

Ana Paula Coelho

Jeito

De tanto te olhar
me deu febre
e o tanto de febre
me deu jeito
de falar
ainda que em brasa
o que sinto no peito.

Ana Paula Coelho

Me importa saber

desenhando no ar 
tua forma de se calar 
e se manter abstrato
até mesmo na foto
do velho porta-retrato
me importa saber
ainda que seja quase
do teu sério mais lúdico
meio cínico meio kamikaze

Ana Paula Coelho

Transamor

trans
forma
dor
é o amor

que pega o último instante
e converte em eternidade
pega o próximo sorriso
e rabisca um coração

Ana Paula Coelho

Desejo de voo

Teu beijo
Delírio de sonho
Esboço surrealista
Desejo de voo
De asas na ventania.

Ana Paula Coelho