Zizo e Eneida

Desse filme que tanto me marcou por sua densidade, deixo o registro cronológico dos três poemas que Zizo (Irandhir Santos) escreveu para sua musa Eneida (Nanda Costa) em Febre do Rato...


Observo a coisa que se aproxima
Com a arma em punho
E na outra, bastante trêmula
O desprezo de suas investidas
Desnudas à porta dos dias
Semimorta no centro do mundo
Agressiva nas coisas miúdas
E abstrata, nos problemas dos dias.

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Fodendo calada na noite
Furacão distante e lindo
Sua prosa leve e solta
Maligna em sua atitude
Fria em sua dureza
Recebo no rosto o seu mijo... mirrado pelo espelho
Que nem tempo dá para reparar no reflexo
No cabelo complexo da boceta da menina
E na mão antiga, amiga enfadonha
Precipita sobre o corpo vadio
A baba do quiabo tocado pela imaginação.

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Escrevi meu nome em um sacrário
Que se encontra ao lado da geladeira
E próximo aos pequenos frascos de remédio
E junto a isso tem uma estante
E sobre essa estrutura um espelho
Que reflete o rosto do homem
Com quem cotidianamente tu compartilhas o dia
E faz coisas diferentes
Como declamar o abecedário de traz pra frente
E eleger certas cores raras, como suas preferidas.
O homem comum, o mesmo do espelho
Não acreditava muito nos pensamentos, e começou a listar:
Passei o dia cortando passos, arrumando coisas
Desfazendo nós, roendo as unhas
Falando só, assistindo TV
Descobrindo ruas, circulando mapas
Fumando cigarros, trapaceando bandidos
Viciando o organismo, analisando o sangue
Regendo conflitos, adulando desejos
Reinventando sonhos, evitando pânicos...
Destratou seus sentimentos como que pedindo benção a Deus
E ao Diabo pra o livrar das contas, e entrou em casa.
Deixou a arrogância lá fora descansando
Pra beijar a juventude que dormia no sofá.
Beijou, e sua mão entrou tanto, tanto, tão longe
Que alcançou o coração do sonho
E ali teve a certeza de que queria entrar
No sonho por inteiro.