Tentar esquecer

Se o meu tentar esquecer fosse música
terias em tuas noites 
uma balada triste
uma beleza que só existe 
distante de todos os olhos

Se o meu tentar esquecer fosse livro
terias em tuas páginas
preâmbulos, epílogos
refeitos centenas de vezes

se o meu tentar esquecer fosse tanto
terias em tua lembrança, meus planos
e o medo de me tentar outra vez.

Ana Paula B. Coelho

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Janelas

talvez o maior segredo dos poetas
se esconda nos olhos:
janelas cujas cortinas são pálpebras
que quando se fecham
denotam o contraditório da alma
a construção poética do coração

Ana Paula B. Coelho

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Um bloco de notas

Alguns dias passam 
como se o amor não fosse mais prioridade
talvez a rotina seja o que não me cabe
na cama, no mar, no coração de um poema

penso que o único lugar 
onde ainda encontro nós dois
está morrendo no escuro
não é uma sala sem lustre
tampouco uma esquina sem poste
não é uma noite sem lua
ou mesmo o fundo do poço

é apenas um bloco de notas
baixado no meu celular
esperando o movimento dos dedos
que escreveram momentos
desejos esquecidos
escreveram esperanças
que já nem tenho mais.

Ana Paula B. Coelho

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A última fronteira

até conhecer Miguel eu não vivia
apenas pensava que vivia
precisei beijar a morte
e senti-la a cada segundo
pra saber quem eu era
pra saber até onde eu iria

Ana Paula B. Coelho

(Inspirado no filme: A Última Fronteira
com Charlize Theron e Javier Bardem)

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Beijo e rima

ainda que menos brilhantes
continuam estrelas
num céu infinito de azul 
infinito de tanto que amamos

quem me olha me pensa completa
como lua e sol, noite e manhã
mas não sabe, não leu em meus versos
que os poemas não contam quem são

toda estrada se molda ao tempo
e no tempo não se vive em vão
e se longe se estendem dois corpos
um terceiro espera o verão

e assim esperei minhas noites
entre tardes de orvalho e de flor
sempre soube que um dia seria
da areia, do mar, do amor

de palavras vivi - beijo e rima
com sorrisos calei meu refrão
entendendo que toda rotina
me afastava do meu coração

infinito de todos que amamos
num céu infinito de azul 
continuamos estrelas traídas
ainda que brilhantes

Ana Paula B. Coelho

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Colateral

Uni verso 
esparso
sideral
colateral

se beija
se morde
se adora
se odeia
se permite
se pondera
se completa
ou some.

Ana Paula B. Coelho

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Eventualmente

Era uma cama feita de esquinas
de pontes
ladeiras e praças

Tinha um boteco 
com bebidas de graça
pra derrubar a coragem 
garganta abaixo

Nela não se dormia lençóis
fronhas, bichinhos
almofadas

Onde a paixão 
eventualmente se encaixa
colcha de retalhos
conta em pedaços sua história.

Ana Paula B. Coelho

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O mais sonhador

ainda parecia sem sentido
as músicas que por vezes batiam
o sol que eventualmente dourava
a pele, os cabelos, as sombras

tinha a leve vergonha de ter sido idiota
inocente, despreparada
mas também tinha o sabor, a inspiração
dos versos que tomaram coragem e sairam
livres, destemidos
certos de que um dia teriam onde pousar

e o pior talvez fosse a indiferença
disfarçada de amizade, de respeito
de alguma preocupação
apesar de tão óbvia
irritando meu coração

ainda que a verdade orbitasse nossos corpos
de destinos diferentes, quase opostos
não fosse o fato de se cruzarem
nos breves espaços entre um corredor e outro
nas escadas, nos intervalos

e o tempo transformando nossos passos
os dele cada vez mais adiante, mais exatos
enquanto os meus travavam no passado
embaraçados, sem vontade de mudar
mas dos dois, quem era o mais solitário?
e o mais sonhador?

penso que tudo cabe numa rima
minha percepção do que nunca existiu aos olhos dele
e do que sempre haverá bem profundo nos meus

Ana Paula B. Coelho

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Centenas

somos pequenos pedaços
entre versos
entre espaços 
distantes estrelas

somos dilemas
esquinas ladeiras 
descendo recaídas 
virando lágrimas num poema

somos centenas

Ana Paula B. Coelho

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Versando o aço

entrelinhas
entre laços
disfarço
o que foi em vão

(di)versos 
são os espaços
de aço 
o meu coração

Ana Paula B. Coelho

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Solidão abençoada

Descansa solidão, jamais se exaspere 
se tal condição não mais te inspira bons versos
sempre terás um amanhã de tardes e noites diversas

Convide a lua pra tua cama
em quarto crescente a madrugada declama
poemas de amor, de sonhos, de mar em tempestade

Não desperdice tuas lágrimas com saudade
a distância nada mais é que um velho porto sorrindo
salvando lembranças quase naufragadas

Repouse teus olhos no mar - solidão abençoada
que no abissal está tua essência inabalável
embora a superfície insista em resgatá-la.

Ana Paula B. Coelho

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Senryu 3

o verso também foi rima
depois de ser instante
e não foi o bastante

Ana Paula B. Coelho

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Turbinados

e as turbinas se estendem
não só aos aviões
mas ao café, ao cigarro
ao poema que resiste parado
aqui dentro

eu trago 
eu bebo
eu vejo nublando no céu o metal 

cigarro 
café 
avião
turbinados

e o poema aqui dentro parado
me consome

Ana Paula B. Coelho

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Fora do meu tempo

se tivesse chuva
calçadas empoçadas 
e em cada poça
um espelho para os postes
eu caminharia sem parar

porque quando a noite começa
começa também o vazio instigante
que me inspira, mas consome
que faz a realidade pontuar

horas, minutos 
segundos
num relógio fora do meu tempo
num plano infinitamente pequeno

Ana Paula B. Coelho

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Ritmo distante



Não me agradam
essas coisas que despertam
barulho, susto, água fria
tudo na minha cara
mais nenhum sonho por perto.

Não me agradam
essas coisas que adormecem
vazio, escuro, calmaria
tudo que lembra morte
quando nada mais dá certo.

Não me agradam
essas coisas sem poesia
uma noite só noite
um dia só dia.

Noite e dia - Alice Ruiz


como fumaça colorida no ar
formando contornos abstratos
soltos 
livres em seu bailar

um ritmo distante
conhecido somente no espaço que se contradiz
no vento que se desencanta
no tempo que passa feito um soneto
nesse amor que me consome
que me desliza entre os dedos...

seria gelo derretendo
seria vinho
ou apenas suor dos minutos de anseio
do desejo por um futuro que não vai chegar?

a espera é longa
assim como os teus olhos de noite sem luar
e o brilho é antigo
nos meus olhos que jamais se fecham pra esse céu
no meu coração que ainda vai morrer batendo
descontroladamente em tantos poemas...

meu verso nunca se dissipa
é uma voz que não se cala
o amanhã é repleto de ontem
e eu me pergunto até quando?

Ana Paula B. Coelho

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Letra favorita

é da sinceridade que o amor sobrevive
ela garante conexão
lealdade, extensão 
a possibilidade de reatar 
sempre que houver uma briga

a sinceridade não vive só de pele
de beijo, de toque, de olhar
ela mora no coração
na letra favorita da canção
que embala e enlaça os dois

a sinceridade não deixa o hoje pra depois
não apaga o passado
não atrasa o futuro
não muda conforme as estações do ano
e jamais perece

é inspirada como o vento
poética como a chuva
delicada como flor de cerejeira
e tem raiz forte
tem sementes

Ana Paula B. Coelho

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Far away

tão distante e tão perto

eu não atento aos teus defeitos
também não te exalto as qualidades
apenas sinto quando temos um instante

teu olhar como quem se distrai, mas puxa assunto
teu sorriso como quem se atrapalha, mas me faz rir
teu poder como quem sempre fode, mas não comigo

eu sigo sem querer
tu segues sem saber
e nós nos esquecemos

Ana Paula B. Coelho

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Atalhos

queria caminhos menos concretos
menos certos do lugar onde se vai chegar

eu anseio por futuros já cheios de saudades
traçados por rumos, pousos menos obscuros 
onde os sorrisos não desaparecem dos lábios
e celulares não encontram sinal pra se comunicar

eu queria mesmo um lugar arejado de promessas
onde o sol aquece também o avesso das palavras
onde os olhos se abrem apenas enquanto dormimos
e o vento sussurra atalhos bem longe dos abismos

Ana Paula B. Coelho

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Elo

ainda nos olhos
o rosa, o azul, o amarelo
e um elo entre o que não percebi

Ana Paula B. Coelho

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Lugar de origem

Outra vez meu tempo
traça um rumo de palavras
que quando chegam
não se alinham numa rima

deixei tudo esquecido numa esquina
as horas, as vontades crescentes
os teus olhos ainda ausentes
alheios ao lugar de origem

penso em teus olhos
em teu olhar sem porto
teu coração sem repouso
sem sossego pra ficar

teu relógio arrasta precisos ponteiros
o meu é rústico feito um realejo
desce, sobe, gira a manivela 
não escolhe a música que vai tocar...

eu lamento as diferenças que nos distanciam
o receio que gela tuas mãos sombrias
teu descaso de conversas
tuas entrelinhas.

Ana Paula B. Coelho

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Nuvens

existe um caminho secreto
para o encontro de nossos olhos
de nossos lábios que já se tocaram
e deixaram desejos profundos de coração

existe um atalho esquecido
à margem das estradas sem sonhos
com uma corda meio bamba
onde sempre precisamos nos equilibrar
desafiando contrárias energias
desencantos alheios a nos espreitar

existe ainda um meio termo 
do qual já nos utilizamos
uma desculpa estreita e encoberta
por nuvens de um futuro que nunca habitamos

existe aquela velha esperança 
perdida na página central de um livro antigo
e essa é a parte que devemos descobrir
se é o mesmo ponto afinal ou novo ponto de partida

Ana Paula B. Coelho

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Ainda frágil

Outra vez aquele esclarecimento inconveniente
e a roda a girar
repetindo os mesmos pontos de partida
o mesmo terminar

em nuances
muda-se a rota, a paisagem
e persigo as mesmas folhas caídas das árvores
norteando labirintos

me alimento das mesmas tardes
sublimes e de segredos dourados
da mesma noite
eterna de sombras de lua

em beijos de vento
ganho rápido as alturas
devoro espaços
transmuto infinitos

e apesar do tanto de passado já vivido
ainda frágil
permaneço presa ao azul desse planeta

meus acertos sobrevivem
demarcam na órbita as horas em que me perco
do meu rosto acrílico
de seu fatal desbotar.

Ana Paula B. Coelho

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São detalhes

é encontrar a paz no meio do caos
a luz na noite do caminho
o sorriso de reconstrução
a leveza no toque, no carinho
e a cama no fundo do coração

são detalhes
que descrevem bons momentos
a importância de todos eles
e a exclusividade de cada emoção

Ana Paula B. Coelho

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Meio termo

Distância 
separa corpos
mas nunca intenções

espaço contraditório
que instiga 
que acolhe desejos

essencial a reciclagem 
de sentimentos
de destinos

Certo dia
muito próximos
estivemos

do início 
do fim 
do meio termo

e não estabelecemos
a vírgula... a volta
o ponto de despedida.

Ana Paula B. Coelho

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